4.27.2007

Quem foi o arquitecto desta estrada? (Cuba)

Dia 270
Km 15756


Depois da noite "santeaguera" na cidade de Santiago de Cuba seguimos viagem.
Pedalávamos junto ao mar com a Sierra Maestra ao nosso lado direito numa das províncias mais remotas da ilha, Granma.
Paramos numa cafeteria estatal apenas para comprar água, era meio dia e o calor abrasador não convidava a pedalar. Uns locais convidaram-nos para tomar um rum e depois outro e quando a sua garrafa acabou, sacamos da nossa "Guayabita del Pinar" dos alforjes e já não partimos....
A província de Granma não vê muitos turistas. Uma zona remota da ilha tendo como coração a Sierra Maesta, onde Fidel e os seus camaradas iniciaram a "revolução" e "libertação" da ilha. Esta região parece estar um pouco esquecida, como um local me contou: "nós iniciamos a libertação da ilha do tirano Batista, e agora fomos esquecidos pelo governo central.

Em cuba encontrar uma casa particular para passar a noite ou um local para comer normalmente nunca é um problema, mas nesta parte da ilha, por vezes encontrar as necessidades mais simples para um ciclista viajante podem tornar-se numa pequena aventura.
Paramos na pequena cidade de Niquero para comprar comida para cozinhar,eram 3 da tarde e o mercado agro-pecuário já não tinha quase vegetais nenhuns á venda. Com um pouco de sorte encontrávamos algum local que nos quisesse vender peixe, ou melhor ainda umas lagostas ou camarão, que apesar da sua venda ou consumo por parte dos cubanos ser ilegal, sabíamos que não deveriam ser muito caras. A pesca de crustáceos esta destinada exclusivamente para consumo pelos estrangeiros nas estâncias turísticas e para exportação.

Compramos cebolas pequenas e cheias de terra no mercado agro-pecuário a um senhor que levantou o prato da balança e ficou com ele no ar a olhar para nós. Só passados uns instantes é que me lembrei que em cuba quando vais ás compras tens que levar o teu saco, o que me parece uma forma bastante ecológica. Sem saco á mão , despejou as cebolas para o meu malote da maquina fotográfica, e seguimos pela rua da aldeia levados por um individuo a casa de uma senhora que me vendeu café moído á mão e embrulhado numa folha de jornal. Indicou-nos uma vizinha para comprar-mos 4 cenouras e uma couve, e que nos ofereceu uma cabeça de alho. Como a notícia se espalhou de que andavam 2 turistas á procura de peixe, fomos levados a uma outra parte da cidade onde um individuo nos vendeu 2 peixes frescos por apenas 20 pesos (0.55 euros), ao que viemos a saber mais tarde que tínhamos sido roubados no preço. Compras feitas e já tínhamos conhecido metade da cidade.

O plano do dia era chegar á pequena aldeia de Las Coloradas, local onde Fidel atracou a bordo do famoso barco Granma, visitar o museu alusivo á cena, e passar a noite no parque de campismo local. Parques de campismo em cuba, ao contrario do resto do mundo, não são lugares para acampar. São estância de férias para cubanos, raramente usadas por estrangeiros, com habitações familiares e actividades diversas centradas numa discoteca ao ar livre e com música em alto e bom som pela noite dentro. Disseram-nos que estava cheio (por vezes é a resposta dada quando não aceitam estrangeiros), mas que podíamos montar a tenda do lado de fora do campismo, apesar de haver bués de espaço dentro, na relva, junto a uma das estradas de acesso ao parque, que parecia ser o local onde os garotos da aldeia congregavam e com a discoteca do outro lado do muro o que implicava adormecer ao som de Regaton. Não era bem o que procurávamos depois de um dia duro a pedalar pelas encostas da Sierra Maestra, além de que queríamos fazer uma fogueira para assar o peixe.

Conhecemos o Lionel na aldeia que nos ofereceu a sua humilde casa para dormir.
Em cuba numa sociedade supostamente de `igualdades` existem dois grupos económicos distintos, que quase se poderiam separar, se bem que erradamente, pelo sistema monetário de duas moedas. Os Cubanos que tem acesso a pesos convertíveis, são os que trabalham na área do turismo e os que recebem donativos de familiares a viver no estrangeiro. E os que não tem acesso a divisas ou pesos convertíveis, cujo salário de 300 pesos cubanos por mês (10 euros!),não lhes dá para muito, apesar de o estado subsidiar fortemente os produtos essenciais e de oferecer um excelente serviço gratuito de saúde e educação (dos melhores de toda a América latina).
A família do Lionel pertencia ao ultimo grupo. Recebeu-nos na sua humilde casa onde cozinhamos o peixe no carvão envolto em folha de bananeira enquanto nos contava a sua versão de vida na ilha...

Nos dias que se seguiram, a viagem entre Mazanillo e Ciego Avila foi bastante monótona. km apos km de plantações de cana do açúcar, plana e quente. A monotonia da pedalada era quebrada pelas vozes de crianças vindas de um jardim junto à estrada ou da intimidade de um lar, a gritar :
-TU-RIS-TA!!
-TU-RIS-TA!!
Ou pelo ocasional
-Psssss!!
-Pssssssssss!!
de jovens raparigas numa paragem de autocarros a chamar a nossa atenção.
O "Piropo" como è chamado esse costume cubano, aparentemente originário da península Ibérica, e que seria considerado rude ou mesmo assedio sexual em muitos países ocidentais, aqui, è apenas uma forma de chamar a atenção e de elogio para com o sexo oposto. A forma mais vulgar è um simples "Psssss", mas há também formas mais elaboradas que mais parece o chilrear de um rouxinol numa madrugada de inverno.

Outro entretenimento nas estradas cubanas são os próprios cubanos em velhas bicicletas soviéticas, sem travões, sem mudanças e por vezes sem selim. Passavam-me com certa regularidade, orgulhosos e com cara de gozo a olhar para o turista numa bicicleta carregadíssima e com a cara avermelhada e suada do esforço sobre um sol quente. Por vezes seguiam ao meu lado conversando alegremente durante algum tempo, enfiando-se depois por algum campo de cultivo, outras vezes convidavam-me a parar e a tomar algo nas suas casas.
Terminaram as férias em cuba para o Isaac, que iria ter com a sua namorada ao México. Eu segui sozinho para Trinidad. Uma cidade museu na costa sul da ilha, e uma das cidades coloniais mais bem preservadas de toda a ilha.
Dois dias depois estava de novo na estrada. Uma estrada que parecia subir do mar às nuvens em escassos kilometros.
Os 20 km desde Trinidad até Topes de Collantes, para minha surpresa, iriam ser não só dos mais duros em cuba, mas também de todos os 15000 Km que pedalei desde que saí do ártico há 9 meses atrás. As inclinações da estrada que por vezes ultrapassavam os 20% eram simplesmente cruéis.

O arquitecto da estrada foi um burro, disse-me na brincadeira o dono da casa particular onde me tinha hospedado em Trinidad. Há muitos carros que simplesmente não sobem, continuou. -Se foi um burro, então a minha "burra" também subirà, disse-lhe.
Já há muito que pedalava na mudança mais leve possível e as minhas pernas estavam numa actividade ofuscada de desespero, bombeando os pedais para baixo e para cima como pistões. No entanto a bicicleta quase que não se movia. Estava a usar toda a energia possível e imaginária, no entanto a burra subia a estrada entrelaçada na montanha a passo de tartaruga.
A batida do meu coração, sentia-a na cabeça.
Em pé colocando toda a energia do meu corpo numa perna, pressionava um pedal de cada vez. Os meus músculos gritavam por perdão. Mas estava determinado a não me deixar vencer por uma montanha com apenas 700 metros de altura. Se eu desmontasse aqui, como iria subir os Andes com passes acima dos 4000 e 5000 metros, quando chegar à América do sul?

Ao chegar a Topes de Collantes, no final da subida cruel, um grupo de `hombres` locais, notaram os meus esforços por me manter montado na bicicleta e começaram a bater palmas e a dizer palavras de encorajamento. Sentia-me como Armstrong a cruzar uma meta. Alguém deveria ter colocado uma fita na estrada para eu ultrapassar com as lagrimas a cair-me dos olhos e os braços levantados em triunfo. Mas provavelmente teria caído para o chão. Em vez disso agradeci aos meus entusiastas com um sorriso embaraçoso e pedalei as ultimas dezenas de metros para receber o meu premio: um litro de yogurte de soja liquido com sabor a coco que comprei por três pesos cubanos numa loja da aldeia.

Vários dias depois estava a pedalar no equivalente cubano à auto-estrada Lisboa- porto, `la autopista`, que liga Havana a Pinar Del Rio.
Por vezes, tudo o que ouvia era o guinchar da corrente a pedir óleo, o ruído das rodas a quebrar as folhas secas ou o cantarolar dos pássaros sentados nos fios telefònicos, como se estivessem a por as fofoquíces em dia. Nesta quase vazia estrada de duas vias onde parece haver mais peões do que veículos e donde os cães dormem a sesta no alcatrão quente, ocasionalmente, alguma relíquia de museu que já não teria passado a inspecção 20 anos atrás, ultrapassa-me a alta velocidade, deixando uma nuvem de fumo preto que me deixava a questionar se aquele monte de lata ambulante funcionava a gasolina ou a charutos cubanos. Chocalhando a carcaça, eu só imaginava o momento em que o carro iria desmontar-se, espalhando peça por peça no alcatrão vazio. mas não!
A maioria dos poucos carros que povoam as estradas cubanas são clássicos americanos dos anos 50, barulhentas e ferrugentas peças de arte que se tem mantido nas estradas cubanas há décadas graças ás fantásticas habilidades mecânicas dos seus donos.

Horas depois sai da autopista e Continuei a pedalar para a parte Este da ilha. Um novo perfume pairava no ar com a minha aproximação às zonas tabaqueiras. De vez em quando passava por uma plantação de folhas verdes e frescas e o seu perfume impugnante atravessava a estrada com a minha passagem.

Subia uma encosta até o seu topo, parei e olhei para a minha frente a observar a beleza do vale, O sol caía por detrás dos "mogotes" (formações de calcário) que se elevavam das terras de cultivo vermelhas e verdes como monstros pré-históricos. Ao fundo um carro atravessava a paisagem deixando um rasto poético de fumo através do seu escape, olhei para a estrada entrelaçada na encosta que tinha acabado de subir e sorri. Estes eram os meus últimos esforços feitos nos meus 1600 km de pedalada pela ilha. Os poucos kilometros de `downhill` até á aldeia de viñales eram as minhas ultimas pedaladas em cuba. Com o voo de regresso ao México dentro de dois dias e impossibilitado de adiar o bilhete, apanhei um autocarro para a cidade pastel de um esplendor decadente que è la habana. De novo a bordo do tupolev russo quando os pés dos passageiros eram submergidos pelo "fumo" da ventilação, o turista ao meu lado pareceu-me irrequieto.
-È o ar condicionado, disse tentando tranquilizá-lo. pedi uma cuba libre (rum com cola), e olhando pela janela brindei com a ilha que pouco a pouco ía sendo engolida pelo mar azul turquesa. Se tivesse que descrever cuba usando uma única palavra, teria mesmo que ser RITMO.

Ritmo cuba tem-no aos montes. Um perpectuado pulso latino influenciado por ritmos africanos que se transmite por todos e cada cidadão cubano como se fora algo genético. Qualquer coisa que façam, por mais mudano que seja, parece ser uma serie de passos cuidadosamente coreografados e que deixam o visitante hipnotizado....

Nuno Brilhante Pedrosa
Em cancun, México.

4.03.2007

Noite ´Santiaguera´ (Cuba)

Dia 244
Km 14436


Ainda não estava completamente convencido de que estava a tomar a decisão certa quando embarquei no voo da ´cubana de aviacion´ com destino a La Havana. O voo iria durar apenas uma hora mas o bilhete de 320 dólares mais 20 dólares pela bicicleta eram um arrombo ao meu pequeno orçamento de viagem, e alem disso estava um pouco relutante em por a burra num avião. Mas não iria ter outra opoturnidade tão cedo de pedalar no ultimo dos verdadeiros países socialistas antes que este desmorona-se. quando o Tupolev Russo levantou voo do aéreoporto de Cancun e um fumo estranho apareceu por debaixo dos meus pés, não ajudou nada a fortalecer a minha decisão.

-È o ar condicionado, disse uma turista Americana sentada ao meu lado tentando tranquilizar-me. Ela também iria fazer ciclo-turismo mas organizado e com carro de apoio. Usava o México como plataforma de embarque, uma vez que os cidadaos americanos estão proibidos pelo seu governo de viajar a Cuba, parte do embargo que este pais têm com a ilha.
Ar condicionado? Isto mais parece que vai tudo pelos ares!!!
A bicicleta apareceu meticulosamente intacta no tapete rolante junto com a bagagem dos outros passageiros. Dirigi-me à imigração. Uma cena que me preocupava era o facto de o governo cubano obrigar todos os turistas a obter uma reserva de no mínimo de 3 dias num hotel em Cuba. Uma forma de obrigar os turistas a gastar dinheiro nos hotéis estatais e de desencorajar o turismo independente. Eu não tinha feito essa reserva e caso não tivesse um cupão comprovativo para apresentar, e caso me fosse pedido, teria que fazer a reserva no aeroporto antes de passar a imigração, que provavelmente me iria custar mais do que o valor do bilhete de avião.

O oficial da alfandega, um senhor de meia idade de evidente descendência espanhola,corpo franzino, calvo, olhar prudente e bigode-que supus- amarelado pelo tabaco, pediu-me o passaporte e durante um período que me pareceu uma eternidade, observava a minha foto de cabelo curto, barbeado, pele branca e olhar de cansado, com o indivíduo à sua frente de cabelo comprido, barbudo, pele queimada pelas muitas horas a pedalar ao sol e um olhar que não conseguia esconder certo nervosismo. Baixou os olhos e comecou a introduzir alguns dados no computador deliberadamente escondido por debaixo do balcão que nos separava.
-Onde se vai alojar em cuba?
Eu sabia que essa era a pergunta chave. Não podia dizer que iria ficar em casa do meu amigo Chino em La Havana, pois este não tinha efectuado o necessário requisito por escrito as autoridades para poder alojar estrangeiros, tornando a minha estadia em sua casa ilegal e com certas consequências para ele caso fosse apanhado.
-Es lo hotel...En La Havana...momentico!
Pretendia procurar o cupão de reserva entre outros papeis.
-Ah! Hotel Santa Isabel.
Durante o voo tinha procurado no meu guia de viagens o nome e direcção de um dos hotéis mais luxuosos de Havana. Carimbou o visto por 30 dias e apertou o botão que abria a porta ao mundo socialista.

Mas antes de me deixar ensopar pelo ar quente e húmido da ilha, tinha que primeiro decifrar o complicado sistema monetário Cubano. Com o meu cartão da conta corrente levantei 300 pesos convertíveis e 50 desses pesos troquei-os por pesos cubanos, ao que recebi 120 notas novinhas em folha em notas de 10 pesos. Um maço de dois dedos de espessura!
Em Cuba existem duas moedas em circulação, o peso convertível ou CUC, chamado também de chavito, divisa ou por vezes de dólar. O seu valor è idêntico ao do dólar, menos avantajadas comissões, e è utilizado por turistas para pagar alojamento transportes inter-cidades e um pouco de tudo em zonas turísticas, mas tambem è utilizado por cubanos para pagar bens considerados supérfluos e muitas outras coisas. O peso cubano, uma moeda desvalorizada (1 peso são 0.027 euros) usada para comprar comida nos mercados e bebidas (em certos locais), transportes (para cubanos apenas) etc, etc. Os salarios dos cubanos sao todos pagos em pesos cubanos. Uma casa de CUC não aceita pesos cubanos , mas uma casa de pesos cubanos podem aceitar CUC, dependendo das situações. Um sistema um pouco confuso e saber onde se paga com quê, pode ser um problema, mas em poucos dias se aprende a identificar o tipo de moeda a usar.
Iria aprender com os meus proprio erros.
Fiquei três dias em La Havana hospedado em casa do Chino (hector Perez), um artista Cubano que tinha conhecido em Londres durante a sua visita a Inglaterra a convite de um amigo nosso. Cubanos só estão permitidos a viajar para fora da ilha mediante um convite de uma instituição ou particular estrangeiro. Vários dos seus trabalhos ainda decoram as paredes do meu apartamento londrino.

Logo na minha primeira noite em Havana, iria ter uma introdução aos factores que mais delíciam e atraem os estrangeiros a esta ilha: o calor humano e hospitalidade dos cubanos, e os efeitos que o sistema socialista tem na sociedade. Há também os que vêm apenas para relaxar nas areias das lindíssimas praias, mas como poderão essas pessoas conhecer a verdadeira Cuba se ficam alojados em estâncias turísticas onde cidadões cubanos estão proibidos de entrar? E que são levados em excursões a locais previamente escolhidos pelo governo?
Armados com uma garrafa de rum, fomos à casa de uns vizinhos do chino, no bairro 10 de Outubro. O tomás e a sua esposa eram militares de rank elevado e ambos membros do CDR do bairro, e cujo presidente era o próprio tomás.
O CDR, ´comiteé de defensa de la revolucion´, é uma associação supostamente ´não governamental´ com mais de 7 milhões de membros (o pais tem 11 milhões) com trabalhos variados no âmbito da saúde e educação, mas o seu grande sucesso é num sistema de vigilância publica extremamente eficiente que segundo as palavras do chino "o CDR sao o alicerce da revolução e o seu sucesso".

Todas as cidades, aldeias, bairros ou ruas do país têm vários membros do CDR que espiam nos afazeres diários de todos e que são depois discutidos em assembleias locais pelos seus membros, com certa regularidade. O CDR iria estar presente durante poda a minha viagem na ilha, fosse através de cartazes de propaganda nas estradas, conversas com os locais ou em situações que implicavam o seu nome.
Durante a noite, por entre garrafas de rum (eu contei pelo menos 3), o chino foi questionado á parte pelo tomás em relação á minha presença. Eram todos amigos, mas isso não significava que a minha presença nao estivesse a por em risco a reputação do tomas, mas que apesar de tudo não deixou de me receber á boa e acolhedora maneira cubana.

Para rentabilizar as 4 semanas que tinha na ilha do Fidel e para aproveitar os ventos que sopram quase incessantemente de oriente para ocidente, decidi apanhar um autocarro para a cidade de baracoa na ponta oriental da ilha e começar a pedalar daí rumo a Havana. O meu itinerário excluía deliberadamente as estâncias turísticas da costa norte, Guardalavaca, Cayo Coco e Varadero, uma vez que estas eram zonas exclusivas a estrangeiros e, portanto com pouco de cuba para ver á parte da areia branca e mar cor turquesa.
Também è no oriente que se encontram os maiores desafios para ciclismo; a estrada `La Farola`, um dos primeiro sucessos de engenharia do então novo regime, a `Sierra Maestra`, local onde se iniciou a revolução, e onde se encontra o pico mais alto da ilha (pico Turquino a 1972m), e a `La gran Piedra`, uma ascensão aos 1200 metros em apenas 14 km. Na viagem de 18 horas de autocarro conheci o Isaac, um outro ciclista de 22 anos que iria ser o meu companheiro de viagem nas duas semanas que se seguiram.

O Isaac era um jovem Canadense, guia para caçadores de alces e caribu nas províncias do norte do Canadá, e na sua primeira viagem de ciclo-turismo em autonomia.
Baracoa foi o primeiro local da ilha onde Cristóvão Colombo atracou, e a cidade tem forte influencia africana deixada pelas varias gerações de escravos trazidos pelos espanhóis e franceses. Parecia um pouco como se África estivesse a olhar-se ao espelho do outro lado do atlântico.
O meu primeiro dia de ciclismo em cuba foi também um dos mais difíceis. Os 78 km entre Baracoa e Yacamo através da estrada `La Farola`, levou-me desde uma paisagem luxuriante e tropical onde abundam os coqueiros, árvores de cacau e manga, subindo a ´Sierra del Purial´ com acentuadas inclinações que por vezes chegavam perto dos 20%, até ao seu ponto mais alto a apenas 546 metros. Do lado sul da montanha a diferença era dramática, no `downhill` a floresta tropical desapareceu, transformando-se numa paisagem seca e árida, desflorestada, e apenas com alguns cactos.

No dia seguinte continuamos a pedalada pela província de Guantanamo, mais conhecida pela famosa base aérea americana (e tambem pela guaíra Guantanamera!) Tentamos varias formas de aceder ao ´mirador de molones´, um ponto de observação onde se avistava a base aérea mais minada do hemisfério ocidental, mas os acessos estavam todos cortados a estrangeiros, pelo menos em bicicleta! Os locais eram bastante relutantes a dar-nos qualquer tipo de informação. Era óbvio que `Guantanamo Bay` era considerado tabu e um dos factores humilhantes das deterioradas relações cubano-americanas.
Alojamos-se numa casa particular na cidade de guantanamo a 21 km a norte da base americana. Casas particulares autorizadas a receber turistas, cobram entre 10 a 20 CUC (8 a 16 euros) por quarto e sao a melhor forma de alojamento na ilha para turistas.
No dia seguinte continuei sozinho até Santiago de cuba. O Isaac ficou mais um dia em guantanamo para mais umas classes gratuitas de salsa, oferecidas pela jovem (e bonita) empregada da casa onde nos alojamos e que nos tinha sido apresentada como sobrinha da família vinda de puerto padre. Em Cuba o único empregador oficial è o estado. A contratação de empregados por particulares è ilegal, daí que as inúmeras pessoas que trabalhavam em casas particulares nos foram apresentadas como ´primas´ ou ´sobrinhas´ ou membros afastados da família.

Era sábado à noite e eu e o Isaac estávamos de novo juntos em Santiago de Cuba. A noite Santiaguera que ocorre cada quinze dias numa das avenidas da cidade a sul da praça de Marte estava em pleno fervor e nós iríamos fazer parte dela. Centenas de corpos maioritariamente negros, suados pelo ar quente e humido, expostos pela pouca roupa vestida, dançavam freneticamente ao som de Regaton vindo de vários pontos da avenida. Isto não era apenas mais uma festa, era a noite Santiaguera, conhecida por toda a ilha como uma das melhores do tipo. A frenética atmosfera parecia ser tirada do filme ´a cidade de Deus`, mas sem a violência. Os poucos turistas que se avistavam camuflavam-se por entre as multidões. Turistas de pacote estavam provavelmente na casa de La Trova, uma casa cultural que existe em todas as capitais de província da ilha. Mas esquece `La Trova´ ´musica Son´ ou Compay segundo; O que esta a dar na ilha è Regaton.
Um estilo de musica importado de porto rico, que tomou de arrombo todas as caraíbas e além mar. Uma mistura de reage, salsa e com um sabor a tecno, com uma batida repetitiva e irritante, mas que è dançada de uma forma bastante sensual senão mesmo sexual.

Passamos uma noite memorável na companhia do Alberto e dos nossos novos amigos, regada com muito rum e cerveja servida da torneira para uma garrafa vazia de litro e meio de Tu-Kola (a versão cubana de coca-cola), cortada pelo gargalo e a 20 pesos cubanos (0.55 euros) cada rodada. O rum era pouco mais caro a 40 pesos o litro( 1.10 euros).
A Mónica uma das amigas do Alberto estava decidida a ensinar-me a dançar Regaton. Com o seu esbelto corpo negro de costas e colado ao meu, braços semi levantados, tronco ligueiramente inclinado para a frente, as suas ancas moviam-se a uma velocidade frenética contra o meu falo erecto, enquanto que o resto do seu corpo permanecia intacto.
Dança! Dança!
Gritava virando a cabeca para mim e mostrando o seu sorriso natural e espontaneo que me apeteceu roubar e por nos alforjes. Eu tentava em vão acompanhar os movimentos, mas era evidente que aquela dança não estava no meu DNA.
No dia seguinte meio ressacados seguimos viagem.

Estava apenas com 3 dias de ciclismo em Cuba. Tempo suficiente para me aperceber que as minhas pedaladas um Cuba iriam ter um ritmo diferente do continente. Não iria ser uma viagem acerca de paizagens bonitas, desafios fisicos ou viagens interiores. Iria ser uma viagem ás raizes de um povo que apesar de refem na sua propria pátria e de viver sobre o chapéu de um sistema que parou o relógio do desenvolvimento, demontra sem hesitação, aos afurtunados que visitam a ilha, o melhor que tem para oferecer: Calor Humano.
Como se lé nas t-shirts vendidas nas casas do governo: "Soy Cubano, Soy mas humano"
Depois da noite ´Santiaguera´ , decidimos adicionar um novo elemento à nossa bagagem. A partir dali iríamos ter sempre uma garrafa de rum nos alforjes. E a ideia não Tardou a provar-se útil...

Nuno Brilhante Pedrosa
(escrito em) Santiago de Cuba, CUBA.

4.02.2007

Propaganda Socialista (Cuba)

Ao viajar pela ilha de cuba um a Pessoa é bombardeada com a propaganda socialista. Está por todo o lado: cartazes á beira da estrada, pinturas em paredes, murros, em rochas no jardim de um museu ou na floresta de um parque nacional, telhas partidas e agarradas a postes de eletricidade, eletrodomésticos velhos transformados em vasos de plantas no quintal de alguém...
Um testemunho de que o socialismo ainda está bem vivo e presente na vida dos cubanos.

As fotos que se sequem são apenas algumas das dezenas que tirei um pouco por toda a ilha, á propaganda do Fidel e do seu governo, durante as quatro semanas que por ali passei.
Julgo que dispensam legendas...
























































































Nuno Brilhante Pedrosa